quarta-feira, 22 de abril de 2009

A certidão de óbito

O discurso do prof. Cavaco Silva, na abertura do 4º Congresso da Associação Cristã de Empresários e Gestores não é apenas a certidão de óbito de uma já falecida "cooperação estratégica" entre o Governo e o Presidente da República. Longe de ser uma resposta aos vários ataques de que tem sido alvo por parte da maioria socialista (nomeadamente na questão do Estatuto Autonómico dos Açores), a intervenção do Chefe de Estado é um manifesto contra a situação económica do País e surge no seguimento dos sucessivos alertas que o Presidente tem lançado sobre esta matéria. Há muito que o prof. Cavaco Silva tem defendido, em vão, uma "política de verdade", insistindo, entre outras coisas, no crescimento "explosivo" do endividamento externo, no risco dos grandes investimentos públicos, nos factores internos que acentuam a crise internacional e na defesa de políticas sociais que protejam os mais desfavorecidos. Ignorado pelo Governo, que nunca se dignou a levar em linha de conta nenhuma das suas advertências, o Presidente, no seu discurso de sexta-feira passada, não se limitou a coleccionar mais uma série de avisos à navegação socialista: indo bastante mais longe, o que o prof. Cavaco Silva mostrou foi que não estava disposto a continuar a assistir, em silêncio, à crescente degradação da situação económica nacional. A partir de agora, e esgotadas as conversas informais com o primeiro-ministro (em que assentava a "magistratura da palavra"), o Governo deixou de contar, não tanto com a solidariedade do Presidente da República, mas com a sua conivência em matérias fundamentais que afectam o futuro do País e põem em causa a sua viabilidade económica. Ao referir a promiscuidade entre o poder político e os interesses económicos, o "risco efectivo" de se governar para as estatísticas, a falta de "ponderação" de algumas medidas tomadas para combater a crise, a dependência dos empresários face ao Estado, a falta de vontade "política e económica" para "questionar o caminho que estava a ser seguido", a ausência de "coesão social", o prof. Cavaco Silva não se limitou a traçar um quadro deprimente da realidade portuguesa: abriu caminho a um novo papel do Presidente da República que, como ele próprio já tinha referido, não pode limitar-se a "fazer diagnósticos". Ver nisto, como viu o engº Sócrates, uma "política do recado, do pessimismo, do bota-abaixo ou da crítica fácil" confirma, apenas, a pertinência do discurso do Presidente e a validade dos seus argumentos. Não perceber isto é não perceber o essencial.
Constança Cunha e Sá In CManhã

Sem comentários:

Enviar um comentário