O Público chama-lhe o "herói imperfeito". Um governo de direita recusou-lhe a promoção a coronel que este agora - da esquerda "imperfeita" - lhe quer dar. Parece que ele não aceita a prebenda se não lhe pagarem os "retroactivos" desde não sei quando. Um símbolo, portanto. Otelo foi - é assim que reza a história - indispensável para o sucesso do "25/4". Ainda mal estávamos curados da "outra" revolução - a do PREC, do COPCON e da imensa palhaçada em que o país alegremente mergulhou até "25 de Novembro" - e já Otelo se revelava o herói, desta vez perfeito, de gente hoje insuspeita como o ministro da propaganda Santos Silva e outros que tais. Ficou em segundo lugar nas primeiras presidenciais livres, as de 1976, em que o vencedor de Novembro, Eanes, chegou a Belém. Quando estive no Regimento de Lanceiros - Polícia do Exército entre 86 e 87, a principal ocupação dos esquadrões operacionais era ir recolher o "herói" à prisão militar de Caxias e levá-lo para as intermináveis sessões no Tribunal de Monsanto à conta do processo das "FP-25". O "herói" tinha metido a pata na poça e um famoso caderninho preto com as "operações" do bando não deixou dúvidas a ninguém. Como todos os homens que carregam às costas o peso de uma história para a qual não têm dimensão, Otelo Saraiva de Carvalho foi engolido pelos acontecimentos, felizmente antes de ter tido a oportunidade de se fazer ao famoso cavalo do poder que um dia sonhou apanhar. Não o considero propriamente um "romântico" e, como pessimista empedernido, recuso uma visão romântica da história e, em especial, de Otelo. As FP-25, os negócios com Angola etc., etc. afastam qualquer tipo de "romantismo". Percebo que "camaradas de armas" o tivessem defendido enquanto tal. Isso, porém, não absolve Otelo de nada. Nem como homem, nem como o "herói nacional" que, em boa hora, a história que ele queria montar devolveu à procedência.
Publicada por João Gonçalves in "Portugal dos Pequeninos"
Há 7 horas
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